domingo, 10 de fevereiro de 2008

Nação Zumbi - Fome de Tudo (2007)

Bom, escutei esse cd no segundo semestre de 2007. Demorou um pouco pra assimilar o CD, talvez porque eu ainda via muita coisa no álbum auto-intitulado deles (Nação Zumbi, 2002). Depois de um tempo escutando eu percebi a beleza do álbum. Um belo exemplo de CD da Nação Zumbi: trabalho artístico interessante, diferente e muito bonito. Coisa que a banda vem mostrando depois da fase Chico Science, talvez até pelo maior reconhecimento da banda tenha hoje em dia, é a preocupação estética do álbum. Lembrando que interpretação da letra é algo relativo, aqui vai uma análise minha faixa por faixa.

1 - Bossa Nostra: a faixa que abre o álbum também é aquela que tem a introdução mais chamativa na minha opinião. Provavelmente não é coincidência que ela abra as portas pra Nação Zumbi nesse álbum. A letra também é carregada das brincadeiras que Jorge du Peixe gosta de fazer com as palavras e também com metáforas, na verdade há tempos a Nação Zumbi se mostra uma realeza das metáforas. A música usa bastante do estéreo na guitarra do Lúcio Maia, o que dá um efeito bem psicodélico. Muita gente usa esse efeito, mas a personalidade que mais lembra-me dessa utilização é Jimi Hendrix. Há tempos Lúcio Maia deixa várias pistas do quanto ele é influenciado por Hendrix. Essa é mais uma.
2 - Infeste: a introdução dessa música parece ser um prato cheio pra apresentações ao vivo. O porquê? A introdução é algo bem calmo e nebuloso, um prato cheio pra criar o contraste quando entram as alfaias anunciando a infestação. O refrão é outra coisa a frisar aqui, depois de escutar essa música algumas vezes é quase impossível não cantar junto com du Peixe quando é cantado "costas quentes, dentes acesos, olhos de espelho, cabeça de leão. Lançando/livrando o perigo na ponta do enfeite, estica o caminho quem manda no chão". A mim a letra parece uma analogia da música. De acordo com essa letra, "Infestar" é o que a música faz, uma vez pegando uma pessoa, no outro dia pegando outra. Ou seja, na minha interpretação essa música fala metaforicamente da força que a música tem. Mais uma metáfora pela Nação Zumbi.
3 - Carnaval: o que se nota nessa? Ela tem um tempo não tão comum. O próprio Jorge du Peixe brinca com a música chamando-a de "trava perna". Provavelmente essa ficou como minha música preferida ao escutar o álbum algumas vezes. Tem um ritmo e melodia muito bons e uma harmonia bem ambientada, sem exageros. Bem, sem grandes metáforas aqui: a música fala sobre o Carnaval de Pernambuco. Mostra que apesar da evolução a NZ faz músicas falando da sua terra natal.
4 - Inferno: mais uma daquelas músicas nebulosas da banda. Ela mostra algo que gosto demais da fase pós-Chico Science: a exploração do vocal no que eu chamo de "linha doentia". Por isso que gosto do álbum de 2002, ele explora muito isso. Nesse caso se torna mais especial ainda: essa "exploração" se dá por um convidado especial que a primeira vista não tem muito a ver com a música: CéU. No entanto, a combinação não poderia ter sido melhor. A voz dela fez um par perfeito com Jorge du Peixe. Provavelmente é a música mais explorada e trabalhada quando se fala de harmonia, nos efeitos de guitarra e voz também. Uma música não tão rápida, mas que deixa o peso dela nesse álbum.
5 - Nascedouro: uau! Metais! Um ar bem Cubano, um vocal bem falado, um samba bem manhoso, vocais explorados com phasers. É a mistura que só vi Nação Zumbi fazer com maestria. Mais metáforas. Nascedouro é claramente uma oposição a Matadouro. Ao que posso entender, fala de viver morrendo. Aprender com as coisas que acontecem com nosso dia-a-dia. Apesar de que viver é caminhar em direção a morte, a nossa vivênvia e nossos aprendizados nos fazem viver e nascer dia após dias. Esse é o Nascedouro.
6 - Onde tenho que ir: achei que por conta do baixo e da batida a música tem uma levada bem pesada, o que prova que guitarra não é quesito necessário pra peso numa música. A batida eletrônica, junto com o chimbal mais frenético e em companhoa ao de outro som (que não consegui indentificar se é um phaser, um flanger ou simplismente um wah-wah saturado com uma distorção mais leve) dão um ar bem encorpado à levada da música.
7 - Assustado: Dub? Não sei...mas um baixo muito forte marca a música toda. Me parece que toda a música se constrói em volta desse baixo, inclusive os instrumentos. Na música toda se nota Lúcio Maia explorando os sons da guitarra e outros efeitos eletrônicos. Essa é uma música pra se prestar atenção nos sons explorados pela banda, já que toda a melodia da música gira em torno da mesma nota. O vocal tem alguns toques tribais no final. Interessante é esse toque surgir ao acompanhar o riff da guitarra.
8 - Fome de tudo: a faixa que dá nome ao álbum. Lembra do que falei de Lúcio Maia e Hendrix? É só ouvir a introdução e o solo ao final da música pra relembrar os grandes solos de Jimi com o Fuzz Face da Dunlop. Tenho até a impressão de ter visto Maia com esse pedal de fuzz. Não poderia ser mais explícito. A percursão é bem rica jogando elementos graves junto com o baixo e elementos agudos de instrumentos de agitação que Ogan di Belê parece ter usado a música toda. Aqui é entregado o conceito da "Fome de Tudo" apresentada com mais metáforas. A "Fome de Tudo" é a fome de consumir. Nessa música é falado sob o aspecto positivo, fala sobre consumir cultura, consumir conhecimento e, se olhar a Nação Zumbi, me parece consumir todas as influências musicais que os músicos da NZ têm pra transformar naquilo que é a mistura do som da banda. E traz bons resultados, não é a toa que a Nação Zumbi fica entre o melhor da música no Brasil. Sim, "a fome tem uma saúde de ferro".
9 - Toda surdez será castigada: Junio Barreto dá as caras aqui. Ele pode não ter causado o contraste que CéU causou, no entanto a combinação fez-se de um jeito que parecia ele já ser integrante da NZ. Me parece a música mais uma música voltada a harmonia e melodia. O vocal é o centro aqui. Por vezes causando efeitos meio assustadores com vocalizações por outras brincando com a própria escala músical da canção, sem utilizar muito daquele aspecto "doentio" das linhas da banda e deixando ela mais solta pra brincar. Uma bela canção, simples e elaborada na medida certa de torná-la um dos destaques do álbum.
10 - A culpa: mais uma música com ritmo preenchendo grande espaço na música, guitarras com distorção e modulação pesada no refrão. Gosto demais desse repique nas música da Nação. A letra é bem difícil. É o tipo de letra abrangente que du Peixe parece gostar de fazer. Algo de interpretação própria falando sobre a culpa de algo. Por algumas vezes eu até tive a impressão de se tratar do caso da perda do Chico Science e todas as críticas que a Nação Zumbi sofreu por procurarem algo que, diziam, se afastava da proposta inicial do Chico e partir pra algo que chamaram de "comercial". Eu, sinceramente, não poderia discordar mais dessa afirmativa.
11 - Originais do sonho: um ar meio techno. Batida bem eletrônica, muito elementos graves em meio à batida bem hip-hop. A música é bem ambientada, com efeitos de modulação pesada na voz, um ar bem psicodélico nesse elemento. A letra fala da dificuldade do alcançar sonhos. "Nunca é tarde pra sonhar, isso quando se pode dormir" e outras frases entregam o jogo aqui. Sonhar todos podem, mas só quando se pode dormir. O dormir, aqui, é o sentido de ter a abertura pra se concentrar na sua própria vida. Cada dia se torna mais difícil parar. É normal se tratar aqui da correria do dia-a-dia relacionado a trabalho, compromissos, etc. Essas são as coisas que não nos deixam dormir pra sonhar. Os "originais do sonho" são forçados a acordar, viver pra poder sonhar, mas se vêm não conseguindo mais dormir. O ambiente da música dá uma boa abertura pra escutar e aproveitar a letra.
12 - No Olimpo: grande música pra se fechar o álbum. O ar "doentio" que a NZ usa muito (e que acho sensacional) é substituído backing vocals (esses que dão realmente o ar doentio ou não) com mais vida, cantando em notas mais altas ao invés de mais baixas. A guitarra ajuda muito nisso, e a melodia também já que é uma sequência mais limpa e agradável aos ouvidos. O homem tem uma inclinação a achar mais bonito o que é perto do normal e se tocam aquilo que ele quer ouvir.

Um grande CD. Acusam a Nação Zumbi de migrar para longe do que Chico Science fazia. Pois bem, bandas evoluem, os integrantes são afetados por estilos diferentes durante sua vida e com uma banda com o tempo da Nação Zumbi nada mais natural que essa evolução que eles tiveram. Eu chamaria realmente disso, de evolução, nem pior nem melhor que a época do Chico, mas algo que evoluiu através dos anos. Não acho comercial, não acho feito pra MTV, acho uma das melhores e mais originais bandas que existem aqui no Brasil. Aproveitem.

2 comentários:

Universo Tranquilo disse...

Boa postagem!
Abraço,
Zuza Zapata
www.zuzazapata.com.br

Unknown disse...

Como vc interpreta a música bossa mostra?